A GRANDE RESENHA FACIT E JOHN TEXTOR
- Jose Roberto Sampaio

- 23 de set.
- 6 min de leitura
Atualizado: 25 de set.

O futebol é assim mesmo. Há altos e baixos. O Botafogo, no ano passado, teve um desempenho esportivo maravilhoso, fruto de uma gestão de inegável competência. Foi selecionado para disputar a Bola de Ouro, por seu desempenho esportivo e por sua gestão competente, rivalizando com Chelsea, Paris Saint Germain, entre outros. Este ano, infelizmente, as coisas não andam bem.
Em verdade, após uma ascensão meteórica, em quatro anos - o Botafogo saiu da segunda divisão para a glória do título da libertadores - era necessário arrumar a casa. E é isto que está acontecendo. Espero que tudo se resolva logo, que o time se encaixe e os sócios da Eagle, controladora da SAF Botafogo, se entendam.
Neste contexto, fui ao jogo do Botafogo contra o Mirassol. Aproximadamente seis mil torcedores. O pior público do campeonato neste ano. O comparecimento da torcida é um bom termômetro da fase difícil.
Começa o jogo, o time joga bem. Um primeiro tempo digno das melhores tradições do clube. 3x0. Um baile de futebol. No segundo tempo, um doloso empate, 3x3, fazendo lembrar a derrocada no Brasileirão 2023.
Voltando de taxi para casa, ouço os comentaristas esbravejando contra o técnico, os jogadores e, especialmente, John Textor. A mídia esportiva, em geral, é apaixonada como o torcedor. Às vezes mais. Faz parte do espetáculo do Futebol.
Lembrei-me da Grande Resenha Facit, o primeiro programa esportivo de debates no Brasil. Criada pela Rede Record, nos anos 60 do século passado, seguiu sua trajetória de sucesso e muita polêmica, até meados dos anos 70, já na Rede Globo.
Figuras polêmicas e lendárias do futebol brasileiro protagonizaram discussões acaloradas, muitas vezes tensas, todas marcadas pela paixão clubística. Nelson Rodrigues era um deles, sempre defendendo o Fluminense. Certa vez, perguntaram-lhe qual seria a escalação da seleção brasileira, em uma das memoráveis noites deste programa dominical. Ele respondeu citando o time tricolor, do goleiro ao ponta esquerda, “com a camisa da seleção brasileira”.
João Saldanha, o jornalista, técnico de futebol que formou o vitorioso escrete canarinho campeão mundial em 70, conhecido pela alcunha de João Sem Medo, outro comentarista deste inolvidável programa esportivo, tomava as dores do Botafogo.
No auge da ditadura militar, o presidente Emilio Garrastazu Médicimanifestou seu desejo de o atacante Dadá Maravilha ser convocado para seleção de Saldanha. Resposta: “Somos gaúchos, somos gremistas, gostamos de futebol e nem eu escalo o ministério, nem o presidente o time”.
Pouco depois, Zagalo assumiu o cargo de técnico da seleção brasileira. Mas Saldanha não foi preso...apesar de ser comunista declarado. Realmente corajoso.
O ponto de equilíbrio, nesta mesa de debates esportivos, era o célebre jornalista Luiz Mendes, conhecido por sua serenidade, razoabilidade e esmerada educação.
Cheguei em casa, tomei um banho e fui dormir. No meio da noite, acho, não tenho certeza, levantei-me para ir ao banheiro. Quando abro a porta uma luz forte, vinda de um refletor, atinge meus olhos. Em um primeiro momento não consegui enxergar nada. Após alguns instantes, recupero a visão. Não acreditei. Estava eu, na porta do banheiro e dentro não tinha pia, vaso sanitário, chuveiro ou, ao menos, uma toalha. Havia mesas e cadeiras, onde se sentavam apenas homens, quase 10, incluído o cameraman. No ar, muita fumaça de cigarro. Um clima de tensão.
Dois homens discutiam:
- O carrinho do jogador do Fluminense foi criminoso. Atingiu o Jairzinho no peito. Foi penalty claro! O vídeo tape comprova.
- Se o vídeo tape comprova que foi penalty, então o vídeo tape é burro!
Logo reconheci. Não só a fisionomia. Pelo jeito de falar. Nelson Rodrigues e João Saldanha batiam bota, com muita paixão, exaltados.
Quando me viram, a conversa parou. Todos os rostos se voltaram na minha direção. Alguém, com uma voz tranquila, equilibrada, de forma muito educada me convida para sentar-me.
O caro leitor deve estar se indagando como e por que fui parar neste lugar do passado, há mais de 50 anos. Jorge Luis Borges dizia: “Um livro não deve explicar tudo; deve sugerir, insinuar, deixar entrever.” Já Ítalo Calvino afirmava que a literatura deve deixar “espaços em branco”. Pois sim, fica a seu critério, estimado leitor, dar esta resposta.
Aceito o convite. Escolho uma cadeira e me acomodo. Mal me ajeitei no meu lugar, Luiz Mendes – agora identificava quem me fez o gentil convite de participar dos debates – dirige-se a mim e pergunta, como se me conhecesse, com tom acolhedor:
- O que você acha? Foi penalti?
Meu instinto de sobrevivência me alertava para não me meter naquela discussão entre aquelas duas figuras lendárias do futebol brasileiro. Sai-me pelo 38º estratagema de Schopenhauer, mudando de assunto:
- Vocês já ouviram falar de John Textor?
Não ouvi nenhuma resposta. Todos em silêncio. Mas senti que cativei a atenção de todos. Encorajei-me a prosseguir. Comecei a contar tudo que aconteceu com o Botafogo nos últimos quatro anos. Do rebaixamento ao título da Libertadores de 2024. Falei das discussões entre os sócios da Eagle e do mal desempenho, na temporada de 2025.
Só fui interrompido pelo João Saldanha, em toda a minha narrativa. Duas vezes. A primeira foi quando falei que o Botafogo jogou na segunda divisão, no ano de 2021:
- Você é um mentiroso. O Botafogo é o melhor time do Brasil. Vou lhe meter uma bala nos seus cornos se repetir.
Hesitei em responder. Como já salientei, havia um clima pesado na sala. Neste momento, alguém do meu lado puxa meu braço me dizendo, em sussurro:
- Cuidado! Ele pode estar armado.
Abismado, perguntei ao meu interlocutor, enquanto João Sem Medo vociferavacontra mim:
- Por que você acha isto?
- Porque ontem ele ofendeu o Castor. Que ameaçou vir ao programa para tirar satisfações ao vivo. Pode estar de revolver na cintura para se defender.
Lembrei que ele, realmente, tinha o hábito de andar armado. Havia até uma fofoca de que teria atirado no goleiro Manga, do Botafogo, por causa de uma suspeita de suborno infundada. Manga conseguiu fugir, de seu agressor, pulando o muro de General Serveriano, tradicional centro de treinamento do alvinegro carioca.
E recordei-me, também, do episódio mencionado pelo meu sussurrante interlocutor, devidamente registrado na historia do futebol por depoimentos (infelizmente o vídeo da cena se perdeu). Castor de Andrade, notório bicheiro, era patrono do Bangu, naquela época, um dos melhores clubes de futebol do Rio de Janeiro. Saldanha o havia criticado, ao seu estilo, com veemência, por sua interferência nos bastidores do futebol carioca, especialmente nas arbitragens. Algo assim:
- Não tem esse negócio de cartola achar que é dono do futebol. Futebol é do povo, não de bicheiro nem de político. Quem quiser mandar no juiz, que vá apitar jogo de várzea. Eu não vou me calar.
E o Castor, de fato, ameaçou invadir o programa, Grande Resenha Facit, para revidar. O que aconteceu? Veremos adiante.
Neste contexto, dei um sorriso simpático para o João Sem Medo, encarando a ameaça como uma brincadeira. Mantive a calma e serenidade, inspirado na figura de Luiz Mendes, e continuei a contar a saga do Botafogo de Textor, que já faz por merecer uma produção hollywoodiana.
A segunda interrupção ocorreu quando falei do Título da Libertadores:
- Agora sim! Vejo que você fala a verdade! Esse é o lugar do Botafogo.
Quando conclui tudo que tinha para falar – não deixei de mencionar a histórica vitória do Botafogo sobre o PSG, no campeonato mundial de clubes de 2025 , as questões societárias, em todos os seus detalhes, e o empate com o Mirassol da noite recente - todos presentes pareciam perplexos.
Talvez, pela primeira vez no programa, tenha havido uma unanimidade. Todoscomeçaram a falar, ao mesmo tempo, sem que eu conseguisse identificar quem:
- Esse John Textor é um gênio!
- O que aconteceu com o Botafogo foi um milagre!
- E o santo tem nome: John Textor!
- Ele vai vencer a tudo e a todos!!
- Quanta visão! Quanto coragem! Que empreendedorismo! Pessoas assim que mudam o mundo.
Ele é um verdadeiro navegador português, cruzando o Bojador.
- O Botafogo é o maior de todos!
Ninguém falou da crise vivida pelo Botafogo, em 2025. Das questões societárias. Do jogo do Mirassol. Vi, então, com clareza: nada disto é relevante. O que importa, verdadeiramente, são as conquistas, os avanços obtidos recentemente dentro e fora do campo, neste período glorioso da história do clube, que recolocaram o Botafogo em lugar de destaque, no cenário do futebol brasileiro e mundial.
De repente, adentra no estúdio da Rede Globo, Castor de Andrade, cercado de seguranças armados, aos berros, tudo transmitido ao vivo:
- Eu sou homem, não aceito calúnia.
Estava perto da porta. Pensei: “Está na hora de eu ir embora”. Sai à francesa. Pela mesma porta que entrei. Sem me despedir. Cheguei no quarto, ainda com vontade de ir ao banheiro. Não compreendi direito. Estava na cama, sem ter passado pela porta.
Levantei-me mais uma vez e, desta vez, achei a privada no seu lugar. Voltei a dormir, apesar do estresse da situação que acabava de vivenciar, fosse verdadeira ou não.
Não estava mais chateado com o resultado do jogo, nem com a crise no Botafogo. Tomou-me um sentimento de que tudo vai dar certo. Afinal o Botafogo é um clube vencedor. Maior do que qualquer crise, dentro ou fora de campo. O futebol é assim mesmo. O Botafogo é assim mesmo. A má fase vai passar. E as vitórias voltarão.
A propósito, caro leitor, para quem não sabe, João Saldanha e Castor de Andrade sobreviveram ao duelo no programa esportivo, que ficou só nas ofensas mútuas.
Rio de Janeiro de setembro de 2025
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