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LETRA MORTA


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Desde que a leitura de material impresso fora proibida, por ato complementar da Câmara Federal para Reeducação do Povo, confirmado pelo Supremo Tribunal Renovado, os textos longos foram desaparecendo das redes sociais. No início era mal visto quem postasse mais de 30 linhas. Pouco depois esse limite caiu para 20. E, em menos de um ano, para cinco linhas.


Alguns ainda insistiram. O cronista Sérvulo Esse Romano, com a sua Plataforma Cronicológica de Resistência e o poeta Jairo Yanomami, a partir do site Vozes sem Voz, foram exemplos dessa tentativa de contraponto ao movimento “melhor em poucas palavras” – em minúsculas, como faziam questão de afirmar os acadêmicos que davam suporte intelectual à democratização da linguagem e dos meios, DLM, amplamente aceita pela maioria da população.


Resistência que logo se provaria inútil. As curtidas e comentários, mesmo os de detratores, caíram a próximo de zero, assim como o prestígio dos autores.

Por outro lado, a campanha publicitária dos defensores da DLM, financiada por megacorporações com contratos bilionários com os governos da restauração, bateu pesado naquele período.


Frases como “Tudo o que vale a pena, pode ser dito em menos de vinte palavras. Como isto”, “ A verdade é curta e reta. A mentira argumenta”, “Para de me enrolar: resuma”.

Finalmente chegou-se ao uso dos shts ou brvs, em geral abreviações, utilizando as consoantes de uma única palavra, quase sempre em inglês, terminada em ‘s’. Assim, estou feliz virou hps, estou triste passou a ser sds e vamos nos encontrar tornou-se gtms.


Walter Buendia, representante da maioria falante na Câmara Federal para Reeducação do Povo, propôs o PL 1043/2034, que propunha o fim das figuras como forma de conversação pelas redes. Segundo ele, “há uma real necessidade de que as pessoas escrevam e não apenas cliquem em ícones disponíveis, sob pena de termos em curto espaço de tempo uma maioria iletrada, com grave comprometimento do progresso e da manutenção de nossa honorável democracia”.


O projeto de lei foi aprovado e as figurinhas foram banidas para a deepweb, onde pontificavam os anarco-simbolistas e os signoterroristas. Buendia não se reelegeu e terminou seus dias peneirando terras raras na colônia penal T32A numa lua de Saturno. A maioria de seus seguidores, ajoelhados em praça pública, com transmissão ao vivo para uma plateia de 30 bilhões, fez o juramento da não palavra. O restante teve destino semelhante ao do líder.


A língua escrita estava morta. Os membros da elite triliardária se regozijavam: “agora sim, no more lies, no more fakes, only o que dizemos ou dissermos no futuro, que será fantástico.”

A língua escrita estava morta. Com uma exceção. Na frente dos prédios das grandes corporações, gigantescas projeções holográficas exibindo o símbolo de cada família proprietária.

Turistas, empregados, estudantes e até robôs (todos dotados de IA) paravam diante dos símbolos- marcas e repetiam com fervor os slogans disseminados em alto e bom som nos seus AICNOMs – Aparelhos de Conexão com a Nova Ordem Mundial:


“Forever Coke

The Best APL

Chinese's Pictures

Tesla wants you

Good morning South America”

E outros.


Jorge Cardozo

Escute esses excelentes artistas da Baixada Fluminense




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