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É PRECISO TER ESPERANÇA

José Luiz Alquéres – Membro Titular do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro - IHGB
José Luiz Alquéres – Membro Titular do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro - IHGB

A esperança é sempre uma seta apontada para o futuro. Mesmo quando o presente se mostra exausto de sombras, ela insiste em filtrá-las, como se lembrasse que a História não pertence aos que desistem, mas aos que permanecem.


As coisas mudam — às vezes por força do tempo, às vezes pela coragem humana. Por isso, a esperança não é um adorno da alma, mas um trabalho cotidiano: exige ação, vigilância e a recusa obstinada de se render.


Há momentos, porém, em que o ato de renunciar à própria vida transforma-se, paradoxalmente, em um gesto político. Assim foi o suicídio de Stefan Zweig e de sua esposa, em 1942. À primeira vista, poderia ter parecido o desespero final de um humanista diante do colapso da civilização europeia. Mas o gesto, trágico e silencioso, ecoou como um trovão: despertou indignação, abalou consciências e denunciou ao mundo a ameaça iminente de extinção da cultura humanística alemã. Um alerta, não um sussurro. Um clamor, não um fim.


Vivemos hoje uma encruzilhada que, embora distinta, guarda algo desse mesmo dramatismo histórico. Enquanto, em Belém, durante a COP30, na vastidão amazônica, se discutiam caminhos para que o planeta alcance emissões líquidas zero até 2050, o Brasil assistia a decisões que caminham na direção contrária:


a abertura da Margem Equatorial à exploração de petróleo, ancorada no argumento infantil de que, “se todos fazem, também faremos” — como se o erro alheio pudesse absolver o nosso;• a flexibilização do licenciamento ambiental, um golpe contra uma das práticas preservacionistas mais sólidas do país; e• o Marco Temporal para demarcação de reservas indígenas, que transforma décadas de omissão estatal em benefício para grileiros e desmatadores.


Nenhum discurso oficial consegue desfazer a gravidade desses movimentos. E pior: eles não são sequer necessários. A agricultura brasileira, a produção energética e a mineração — todas elas — podem prosperar sem violar as fronteiras do bom senso. Há milhões de hectares de pastagens degradadas à espera de uso inteligente. Há campos maduros de petróleo — tidos como esgotados pela Petrobras — que, sob novos operadores, renascem com vigor inesperado. E há caminhos para uma mineração ambientalmente responsável, feita com as comunidades indígenas como parceiras e não como vítimas.


Por isso, mesmo diante de retrocessos tão evidentes, não nos é dado o direito de entregar os pontos. Nossa responsabilidade não termina na soleira do presente: ela se projeta sobre as gerações futuras, que herdarão o mundo que construímos — ou que destruímos.


A História, afinal, nunca foi escrita pelos que se acovardam. Churchill atravessou a escuridão da Segunda Guerra com a fé inabalável de que a liberdade prevaleceria. Margaret Thatcher enfrentou interesses seculares para atualizar a economia inglesa. Adenauer, humilhado pelos vencedores da guerra, reconstruiu a Alemanha como potência industrial. Mandela saiu da prisão para reconciliar um país que tinha tudo para explodir em ódio. E o Japão, que viu uma tradição milenar de endeusamento do Imperador ser esmagada, levantou-se para se tornar, em poucas décadas, um dos pilares do Pacífico.


Nada disso aconteceu rapidamente. Nada se construiu sem sofrimento, paciência e trabalho. Mas o resultado — sempre — compensou o sacrifício: devolveu dignidade, estabilidade e, sobretudo, esperança aos seus povos.


Esperança: não apenas virtude da fé cristã, mas também instrumento político. É ela que deve ser insuflada nos momentos em que o país parece perder o rumo. Seu trabalho é lento, às vezes invisível, mas é também o mais necessário.


À sociedade civil, às instituições culturais, às lideranças verdadeiras — não às transitórias — cabe a tarefa de reacender essa chama. E fazê-lo apesar dos obstáculos, apesar da imprudência dos que governam, apesar da miopia dos que detêm o poder.


Porque, no fim, a esperança é menos um sentimento e mais uma decisão. E é dessa decisão que depende o Brasil que deixaremos para amanhã.

 

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1 comentário


Sonali Maria
Sonali Maria
há 42 minutos

É isso. Não simpatizo com a figura de Margareth Tatcher não, mas o José Luis Alqueres mostra bem como, principalmente em situações de crise, o.protagonismo.de lideranças que nos façam esperançar e nos dê rumos são fundamentais. Além da salutar disposição, diante da vida, de toma-la como desafio, instigante chamamento à buscar a felicidade, a realização. Ainda hoje estive estudando a figura de Elizabeth I e seu período histórico na Inglaterra, as mudanças e pujança nas artes, ciência, administração de municipalidades, em que ela e os agentes históricos do período deram uma particular Renascença à Inglaterra....a Allana, doutora em linguística, diretora do CEFET morta em femicidio, cantava no tradicional clube de samba Renascença na Grande Tijuca. É isso aí, são desa…


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